| Aluísio de Almeida escreve "em 1611 começa o silêncio na história de Sorocaba (...) Os moradores da vila se mudam para o Itavuvu e fundam a vila de São Felipe, Aparecidinha começa a ser povoada".
Impossível a região estar em "silêncio". Além do atual bairro de Aparecidinha começar a ser povoado, neste mesmo ano, o poderoso D. Francisco de Souza, o homem que fundou a "vila silenciosa", trazia a autorização para importar do Rio da Prata sementes de trigo, cevada e, curiosamente, até mesmo lhamas para o transporte de metal. [29]
Esse período da história de Sorocaba talvez seja um dos únicos, no mundo, a ser definido como "silencioso" por alguém da competência de Aluísio. Esse silêncio, se refere, de forma resumida, a ausência de "Sorocaba" nos documentos, por mais de 40 anos.
Quanto mais leio o que nosso amado Aluísio escreveu, mais concluo que faltou "boa fé" a alguns autores, pioneiros, os quais ele depositou quase toda a sua energia, a sua vida e a sua própria fé. Imagino como deve ter "doído" para alguém como ele, com "sede de saber e explicar".
Impossível sem Aluísio! Sem Alúisio é díficil simplesmente contar a história de Sorocaba. Sem ele, explicar a "fundação" de Sorocaba seria como qualquer ser humano tentar fabricar um automóvel do zero, sem conhecimento algum, sem a sabedoria acumulada ao longo da toda existência humana, desde os promórdios que inventaram a roda.
Quase tudo na história de Sorocaba é discutido. Poucos sabem que "ela" também foi elevada a "vila" em 1670 pelo 2o. Conde da Ilha do Príncipe, que, na ocasião, era de fato proprietário da terras [38]. E essa data é considerada, por diversos autores, como sendo a verdadeira fundação de Sorocaba.Tanto a posse da terra quanto a "fundação" é discutida. Por enquanto, vamos ao que temos como "certezas". As divisas e denominações mudaram diversas vezes. E o período pós-1611, em Sorocaba, é o melhor exemplo disso.
O CAMINHO DA CRUZ
Entre milhares de registros contidos nos documentos encontramos dois que parecem explicar. Pois, exatamente no mesmo dia, 1 de setembro de 1611, um povoado foi elevado e vila em Sorocaba [30] e outro povoado foi criado com o nome de "Santa Ana das Cruzes" em "algum lugar" [32] [34].
Coiscidência? Não se pode chamar de coiscidência, pois, estamos perante milhares de documentos que se relacionam e dentro de um período chamado de "silencioso". Coiscidências assim são evidências. E são muitas.
A região pertencia a vila de Santa Ana. Porém, na composição do nome oficial dessa nova vila de "Santa Ana das Cruzes", com o acréscimo citado, é relevante o conjuno sintático: "Santa Ana das Cruzes". A análise gramatical do conjunto induz à verificação de que, a palavra principal "Santa Ana" é subordinada ao termo "das Cruzes".
Em alguns casos, ignorar a origem das denomicações é um grave erro, pois as "Cruzes de Mogi" que deram origem a atual "Mogi das Cruzes". Muito da história está escondida assim.
Uma ou mais "cruzes de pedra" e um "caminho" que leva até elas é constantemente citado nos documentos utilizados para contar a "história" de Sorocaba. Os registros contidos nos testamentos e inventários da genealogia dos "fundadores" de Sorocaba são específicos quanto a ter sido feita ou instalada por "Bras Cubas"
A CRUZ E O DESCOBRIMENTO DO BRASIL
Vamos analisar os registros em ordem cronológica. A história dessas "cruzes de pedra ou feitas na pedra" começa antes do "descobrimento" do Brasil, lembremos que os navios de Cabral possuíam "cruzes" estampadas em suas velas e não brasões da coroa portuguesa.
Aquelas cruzes "vermelhas" tem uma longa história ligada aos antigos cavaleiros templários e aos modernos maçons. Em 1500 elas representam uma "Ordem de Cavaleiros". Talvez teria sido eles, deles, ou com o patrocínio deles, que a viagem do "descobrimento" ocorreu.
Tanto é que, quando, em 26 de abril de 1500, quando Cabral ordenou aos seus homens a construção de um altar em terra, onde uma missa católica foi celebrada, o escrivão Pero Vaz de Caminha, que reparava em tudo, escreveu para o rei sobre a solenidade: “Ali estava com o capitão a bandeira da Ordem de Cristo, com a qual saíra de Belém, e que sempre esteve alta.” [1]
BRAS CUBAS E O "MESTRE" BARTHOLOMEU
Bras Cubas era um "fidaldo" (filho de algo; de alguém importante), avô da segunda esposa do "fundador" de Sorocaba, Isabel de Proença. Grande parte do patrimônio do "fundador" de Sorocaba "veia" dela. Em 25 de setembro de 1536 entre as terras concedidas a Bras Cubas, está a "futura Sorocaba" [2].
Em 1552 uma das primeiras notícias sobre a existência de riquezas em ouro nessa região se deu através de uma carta do bispo Pedro Fernandes Sardinha ao rei [3]. Neste mesmo ano, dia 8 de fevereiro, Bras Cubas consegue aprovação para "povoar" [4] e o bispo é "devorado".
Em novembro de 1553 o embaixador espanhol avisa de Lisboa, a seus soberanos, que um mameluco havia descoberto minas de ouro e prata no sul pelo caminho do "Peabiru", antes de chegar ao Peru [5].
Em 25 de janeiro de 1555 Bras Cubas concede terras ao ferreiro "Mestre Bartolomeu", este profundamente relacionado a história de Sorocaba e a genealogia dos "fundadores" [4]. Em 1556 duas medidas são tomadas que apontam para o "ouro":
Em 8 de janeiro fica proibido ir para o Paraguay e que "não façam fundição nenhuma de nenhum metal" [7]. E em 11 de fevereiro Braz Cubas proibiu a todos o trânsito pelo campo para o Paraguai e expressamente declara “avisareis a João Ramalho, alcaide e guarda-mor do campo que não deixe passar nenhuma pessoa para ele, sem mostrar vossa licença nem os próprios moradores” [8].
Os padres jesuítas estacionados no planalto de Piratininga noticiavam a possibilidade do motivo ser outro. Segundo Manoel da Nóbrega, uma das razões para que Tomé de Souza mandasse fechar o caminho era o fato da região ter muito ouro e prata.
Em 1559 a própria rainha regente D. Catarina comunicava ao governador Mem de Sá que enviara um mineiro chamado Luis Martins para averiguar as notícias das minas de ouro [9]
Talvez tenha sido "ouro" que fez autores situarem, absurdamente, o destino da expedição realizada por Bras Cubas em 1560, como sendo a Bahia.
É certeza que partiram de algum ponto de São Paulo em junho [10]. Em setembro fundam uma povoação que viria a ser a "Santa Ana das Cruzes". Eles teriam ido até o municipio de Apiahy ou Paranapanema. Um caminho foi aberto para um povoado, que viria a se chamar, também, “Santa Ana das Cruzes” [11]. O mineiro da coroa teria acompanhado a entrada de Brás Cubas até as nascentes do Rio São Francisco.
No ano seguinte (1561), dia 10 de maio, uma carta é escrita a Rainha Catarina detalhando a expedição ocorrida no ano anterior e uma nova solicitação ao "mineiro da Rainha" que adentrasse o sertão é feita [12].
No mesmo mês, dia 20, Brás Cubas estabelece uma fazenda ou sítio num local de onde [13], cinco dias depois escreve ao rei de Portugal anunciando a descoberta de ouro e metais preciosos perto de São Paulo, “30 léguas de Santos”, em Bacaetava, Birácoyaba e Ivuturuna (São Roque) [14].
O CAVALEIRO MISTERIOSO E A CRUZ EM SOROCABAUm "caminho para a cruz de pedra ou feita na pedra" começa a ser registrado nos documentos a partir de 1566. Como citado anteriormente, os documentos e registros aqui citados são especificos quanto a ligação do "caminho que leva as cruzes de Bras Cubas". Em 1566 temos dois que ligam esse caminho, a cruz e a "Ordem dos Cavaleiros de Cristo".
Em maio partiu de Portugal uma armada de três galeões comandada por Cristóvão Cardoso de Barros, trazendo duas cartas, uma para Mem de Sá e outra, com destinário e conteúdo desconhecidos até hoje. A única certeza é que o conteúdo da carta era destinado a um "Cavaleiro da Ordem de Cristo". [15]
Dia 18 do mesmo mês é demarcado o local onde Bras Cubas iniciou um povoado:
"(...) o qual marco há uma pedra grande que está deitada de seu nascimento, na qual foi feita por João Vieira uma cruz (...); outra pedra talada que assim talou o mesmo João Viera e fez outra cruz em cima; (...) ao pé de uma árvore grande (...) e foi feito pelo dito João Vieia como marco uma cruz; (...) sobre uma grande pedra que ali estava deitada uma cruz foi feita pelo dito João Vieira e saindo do mato em uma rossa do Mestre Bartholomeu está uma pedra grande com umas pancadas de machado, foi feito uma cruz pela mãos do Sr Capitão Brás Cubas (...)" [16]
Em 1578 o ferreiro "Mestre Bartholomeu", sogro de Belchior Dias, tio do "fundador" de Sorocaba, é registrado nos documentos como residente onde "tinha chãos, no Caminho da Cruz" [17]. Ele havia "ganho" terras, de Bras Cubas, num local registrado, anteriormente, como "futura Mont Serrat" [6].
Dia 1 de julho de 1583 “três irmãos convém saber o dito Baltazar Gonçalves e Braz Gonçalves e Marcos Fernandes...” pediram terras vizinhas a de Bartolomeu, na rua que vai para a Cruz [19]. Dois meses depois, em 17 de setembro, Antonio de Proença, genro de Bras Cubas e pai da segunda esposa do "fundador" de Sorocaba pede "chãos no caminho da cruz".[20]
Afonso Sardinha, tido como o "primeiro homem branco" na região da atual Sorocaba, fez seu testamento em 13 de novembro de 1592, no qual descreve seus bens, especialmente uma grande Fazenda, onde Braz Cubas teria "umas cruzes de pedras" (Amboaçava) [21].
Segundo os registros Sardinha era analfabeto como quase todos, assinava o nome com uma cruz com três hastes. Seu testamento de 1592, produzido às vésperas de sua partida para a guerra, mostra que possuía navios aprestados para Angola, encomendas em Buenos Aires e negócios e dívidas no Rio de Janeiro e Bahia.
Ele negociava escravos da Guiné, tecidos, marmelada e nativos. Os melhores "escravos mineiros" eram os angolanos. Foi de sua propriedade um dos primeiros trapiches de açúcar no planalto.
O boato de que um de seus filhos faleceu deixando potes de ouro escondidos, além da grande quantidade em testamento, causou um "reboliço".
Um pouco da "farra" nas denominações acabou (por um breve período) quando, em 23 de maio de 1599, D. Francisco chega as minas de Bacaetava, Vuturuna e Jaraguá, na Serra de Biraçoiaba, as quais Sardinha descreve em seu testamento [22].
15 DE AGOSTO DE 1607 E AS CRUZES
Em 1600 um dos fundadores de Sorocaba, o mineiro prático Clemente Alvares, deixa o cargo que exercia em São Paulo e ganha concessões de terras em Ibiaraçoiaba, onde ficou como guardião de certo metal que parecia prata, e também responsável por fazer os testes adequados e construir "fundições". [23]
Em março desse ano D. Francisco de Souza manda erguer um pelourinho no local onde Clemte Alvares havia ganho concessões de terras: Ibiaraçoiaba [25]
Outra "armadilha" está na documentação da Câmara de São Paulo que registra a "compra e venda dos fornos do Ibirapuera", afinal os únicos fornos se localizam na, então denominada, "Sabarabussú" ou "Montserrat". [24]
Em 16 de dezembro de 1606 Clemente é claro: "As minas de ouro que se descobriram nestes anos precedentes (...) Nossa Senhora do Monserrate; Buturunda ou lbitiruna (...) ficam as montanhas de Berusucaba ou Ibiraçoiaba, abundantes em veios de ferro, não lhes faltando do também veios de ouro, que os selvagens cananéas tem por costume extrair".
O relato de Clemente, que era um testemunha ocular, causou a criação de um Novo Regimento das Minas de São Paulo. Segundo ele seria “onde Brás Cubas extremou as suas terras (...) por umas cruzes em pedras escritas e que estão lá até agora”. [26]
E no dia 15 de agosto de 1607 um "engenho de metais" é inaugurado neste local sob a invocação da "Nossa Senhora de Agosto (da Assunção).
Clemente Álvares, Domingos Fernandes, Martim Rodrigues Tenório de Aguilar, Diogo de Quadros, Afonso Sardinha e Bras Cubas são alguns dos muitos nomes presentes na genealogia dos "fundadores" de Sorocaba e que estão ligados a este dia e ao "engenho de metais". Até mesmo Lourenço Castanho Taques, antepassado de Aluísio. [28]
O "silêncio" começa no mesmo dia em que uma vila chamada "Santa Ana das Cruzes" é criada [30] e o pelourinho da "vila silenciosa" é levado para outro local [31].
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