Joaquim Coresca, o homem que salvou o filho do professor Toledo, eu e a história de Sorocaba
1876
04/04/2024 17:49:14
Colégio do Lageado
Data: 01/01/1876
Créditos: Ítalo de Angelis
Na foto está o Prof. Toledo e o ex-escravizado "Coresca", que foi a Guerra no lugar do filho do professor (Foto colorida digitalmente (£)(kids) (escolas) (ez)(guerra do paraguai
Me perdoem os históriadores e antepassados pelos erros e conclusões equivocadas. Fazem apenas dois anos que estudo a história de Sorocaba.
Acredito que somos definidos e constantemente redefinidos por acontecimentos que não controlamos.
Nossas principais preocupações não estão em nossas mãos. Como a saúde de quem amamos ou o nível de álcool no sangue daqueles que passam no sinal vermelho.
Costumo dizer que nas principais curvas da vida, não estamos na direção do veículo. Momentos em que somos guiados pela vida.
Almocei com meu pai no dia de seu desaparecimento. Seu corpo foi encontrado descartado, apressadamente, na beira de uma estrada vicinal, de terra, a 400 km daqui. Ele tinha 54 anos.
Sempre cuidou de sua saúde, mas seu corpo, danificado pelo tempo, foi velado em um caixão lacrado. Investigação. Prisão. Julgamento com júri popular. Foram longos 5 anos. Esgotou toda a nossa energia.
"Por muito tempo ficamos tristes. Sentíamos em cada lágrima que caia. Meu pobre coração não resistia a saudade que sentia do meu pai.
A sua imagem de amor estava presente em nossas mentes. Tudo era motivo de saudade do meu pai.
Via minha mãe entristecida, fingindo estar contente. Mas sua alma estava ferida, muito mais que a minha, foram 33 anos ao lado dele. E pior, ela sabia que sabíamos." Ela não suportou, falecendo em 2018
Entre esses eventos também perdi meu casamento, meu trabalho e muito da minha liberdade.
Duas lições importantes aprendidas com meus pais nos mantém em pé: A fé em Deus e a capacidade do amor em nos fazer suportar o insuportável. Se sacrificaram por esses princípios.
Mas nada me fazia feliz. No limite da minha resistência, após ter tentato de tudo, tudo mesmo, para preencher o vazio que habitava meus pensamentos dia após dia.
Queria morrer para tentar estar com eles, aonde estivessem. Foi o acaso que fez ler sobre a história de Sorocaba, terra onde meu pai se refugiou, viveu, amou, trabalhou, estudou, foi feliz, criou 3 filhos, enfim.
Passei a ver fotos antigas de Sorocaba. Não sabia no momento, mas aquilo estava me fazendo sentir mais próximo de meis pais. Algumas fotos me "transportavam" para o passado, muitas vezes sentia a presença deles.
Tinha certeza que algumas "sensações" nunca mais sentiria. Que a dor e a saudade nunca passariam.Conceitos como justiça, perdão, vingança e muitos outros foram redefinidos.
Aos poucos, bem devagar, dia após dia, fui sentindo algo que nunca havia sentido. Como aquele perfume que, quando você sente, pode não lembrar quando ou onde, mas você "sente" algo.
Entender a história, de alguma forma, me faz entender o sofrimento que passei. Me ajudou a aceitar as "curvas que a vida fez", ainda mais, as perdas que tive. Me trouxe conforto. Me trouxe novo sentido para continuar vivo.
Felicidade tão plena que me faz acreditar que foi vontade de um Deus justo. Tão justo que meu pai está com ele. Observando a minha felicidade. Sempre acreditei em Deus, mas agora me sinto ao lado dele.
Aconteceu quando vi essa rara fotografia do Colégio do Lageado, do italiano Ítalo De Angelis, apareceu na região de Sorocaba aproveitando o intenso fluxo tropeiro.
De Angelis montou um laboratório no Collégio do Lageado por volta de 1875.
Feita um ano após a instalação da 2ª fase, pois se pode ainda notar ao lado direito o barracão construído para abrigar a máquina de beneficiar algodão.
Interessante observar na fotografia a colocação das mulheres em segundo plano, bem próximas do lado de dentro do prédio, somente aparecendo algumas impossíveis de serem identificadas; a outra observação é a quantidade de menores, os primeiros 60 alunos da 2ª fase.
esquerda para a direita no centro da fotografia, está o comerciante de tropas, José Dias de Arruda; atrás, Joaquim Coresca da Fraga Neves, o “Coresca”, ex-escravo e agregado ao Colégio; ao centro o Professor Toledo, de paletó branco.
Com 51 anos, o Professor Toledo usava um “bonet” de seda preta para dissimular os cabelos encanecidos e ralos, um cavanhaque afilava ainda mais seu rosto; em seguida o fazendeiro de Campo Largo de Sorocaba, Francisco.
Mas o professor não conseguiu me impressionar, com todo o respeito, no contexto do "post", quem me impressonou foi outro homem na foto: o ex-escravizado Joaquim "Coresca".
Francisco de Paula Xavier Toledo nasceu em São Paulo em 1825, chegou em Sorocaba em 1840 aos 15 anos, onde foi morar com sua irmã, Benedita.
Em 18 de janeiro de 1847, com 22 anos, foi nomeado o primeiro professor de Sorocaba. Na fundação da primeira loja maçonica de Sorocaba, a Constância, em 8 de abril do mesmo ano, ele estava presente.
Casou em 1849, aos 23, com Delfina Mascarenhas Martins, filha do influente e prestigioso Tente-coronel Antônio de Mascernhas Camelo.
No ano seguinte, aos 24 anos, ele foi eleogiado, pois 48 alunos estavam matriculados na escola fundada por ele.
Em 1854, aos 28 anos, o professor Toledo instala sua sala de aula, na rua das Flores entre o antigo Largo do Rosário e a Rua Direita, hoje rua Monsenhor João Soares.
Seus primeiros alunos não são crianças, presume-se já estarem na faixa dos atuais adolescentes, pois as aulas de Latim e Francês são destinadas na época para esses jovens.
Os seus primeiros alunos, segundo as atas da Câmara, são em número de 26. São filhos das mais importantes famílias da vila. Nota-se com freqüência o sobrenome Mascarenhas em virtude da ascendência e predomínio social desse tronco familiar na época.
Eis a lista dos alunos:
1. Américo Brasiliense de Almeida Mello, irá se destacar na vida pública da província de São Paulo. 2. Antônio Augusto Lessa 3. Antônio de Mascarenhas Camello Neto 4. Antônio Mascarenhas 5. Antônio Moreira da Silva 6. Bento de Mascarenhas Jequitinhonha 7. Bento de Mascarenhas Martins 8. Bernardo de Mascarenhas Martins 9. Cypriano de Mascarenhas Oliveira 10. Eduardo de Mascarenhas Oliveira 11. Francisco Ignácio de Arruda 12. Francisco de Assis Penteado 13. Frederico de Mascarenhas Oliveira 14. Gustavo de Mascarenhas Oliveira 15. João Bicudo de Almeida 16. João Martins de Araújo 17. Joaquim Bicudo de Almeida 18. Joaquim Mariano Corrêa de Moraes 19. Joaquim Martins de Araújo 20. José Dias de Arruda 21. José Mariano Corrêa de Moraes 22. José Martins de Araújo 23. José Rubino de Oliveira 24. Lúcio de Mascarenhas Mastins 25. Otto Langard 26. Ubaldino do Amaral Fontoura
Em 1850 começou a cultivar algodão. Ufa! E tem muito mais, pois ele faleceu em 17 de agosto de 1903, aos 78 anos. Para ver todos os eventos que eu registrei até agora associados ao Professor Toledo estão no link: http://brasilbook.com.br/biografia.asp?lucia=482
Mas vamos falar de Joaquim Coresca, é bem rápido. Apenas uma frase, comprovada pela descrição na foto:
Ele teria partido, VOLUNTARIAMENTE, participado e sobrevivido a brutal e duradoura guerra do Paraguai, susbtituindo Geraldo Caiuby, filho do professor Toledo.
Acredito que o professor Toledo teria sua trajetória profundamente afetada, caso, no lugar do ex-escravizado, seu filho tivesse sido morto em batalha.
O professor Toledo ainda "vive", uma das principais vias da cidade leva seu nome. Acredito que merecia essa homenagem é o ex-escravizado, Joaquim "Coresca", sem ele, nem eu nem o ilustre Professor não estaríamos aqui.
Joaquim Coresca, o homem que salvou o filho do professor Toledo, eu e a história de Sorocaba
Essa parte inferior que era "coisa", porque escrava, ou que era tratada como bicho, como nós tratamos gente camponesa, a gente que está por baixo, a gente miserável, essa gente que estava por baixo, foi despossuída da capacidade de ver, de entender o mundo. Porque se criou uma cultura erudita dos sábios, e se passou a chamar cultura vulgar a cultura que há nessa massa de gente. Darcy Ribeiro (1922-1997)*
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Eu confirmarei perante Deus tudo aquilo que afirmei aos homens.