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O ITINERÁRIO DAS APARIÇÕES. AYVU RAPYTA E A PALAVRA DE LEÓN CADOGAN.
201401/05/2024 16:49:16


próprio autor – como dito, um mero apoio para pesquisas futuras “mais fundamentadas” realizadas por investigadores com “maior preparo científico”. Quadro que permite também entender o importante capítulo da história guarani, de sua língua e de suas complexas noções, assim como um modo peculiar de pensar o conhecimento antropológico e o trabalho indigenista. Todo este horizonte pode ser tomado a partir de uma premissa inflexível para L.Cadogan, a saber, o entendimento da língua como fonte primeira para o entendimento etnológico.Como disse, a fase considerada “científica” da obra cadoganiana é aquela caracterizada por uma menor preocupação com objetos e temas folclóricos e que se volta aos tópicos metafísicos, míticos e filosóficos dos indígenas (em especial, dos Mbya). Nesta fase, ao mesmo tempo que cresce o fascínio com a riqueza e a beleza da “palavra mbya”, observa-se também maior preocupação e cuidado de L.Cadogan com questões metodológicas e com a delimitação de um ideário científico claro e direto, em especial com relação à coleta de dados. Visando “reprimir todo excesso de subjetivismo”, L.Cadogan passou a aplicar regras de pesquisa, cujo cerne radicou-se na coleta, com a máxima fidelidade possível, de narrativas e cantos a respeito da religiosidade guarani, diretamente da boca dos indígenas, com a menor intervenção possível por parte dos investigadores, durante o primeiro ato da coleta. Foram anos de empenho nesta tarefa, em que cada narrativa foi minunciosamente registrada, transcrita, traduzida e reavaliada de modo co-participativo com os nativos, em outros momentos e em outros lugares. Este aspecto é a maior contemporaneidade, a meu ver, de L.Cadogan, no sentido em que, em suas práticas de investigação, ele fez aquilo que antropólogos viriam a fazer somente algumas décadas depois.

As pesquisas etimológicas foram fulcrais, em especial através dos trabalhos de A.Ruiz de Montoya (2002, 2011a, 2011b, 2011c), Restivo (1893) e Antonio Guasch (2008). Somente quando possível, o que não era tão frequente, L.Cadogan recorria à bibliografia etnológica especializada – cujo acesso era escasso –, para comparar dados, ampliar informações, ou corrigir interpretações. A consulta aos trabalhos guaraninólogos foi escassa, em toda a obra de L.Cadogan, mais voltado que esteve ao ensejo de apresentação “crua dos dados”, de ordem linguística e mítica. Exceção à regra foi o trabalho de C.Nimuendaju sobre os Apapokúva (1987), em especial devido ao fato de trazer informações sobre a mitologia recôndita dos Guarani e de ser atento à palavra dos índios, horizonte afim ao das investigações cadoganianas.

Quando li Nimuendaju – recorda Cadogan – já me dedicava como hobby ao estudo dos Mbya, e sabia que ‘yryvovõ’ significava oposto de um curso d’água e serve de ponte para cruzá-lo. Já havia descoberto, também, que a palavra figura no clássico ‘Tesoro de la lengua guarani’ do P. Antonio Ruiz Montoya, S.J., mas escondida entre as centenas de derivados da palavra (agua) que enumera o ilustre linguista, motivo pelo qual o havia escapado a Nimuendaju (Tilas, III, Strasbourg, 1963).

Os informantes de L.Cadogan, tal como aparecem nos textos, foram na maioria das vezes individualizados e, em cada obra, contextualizados e nomeados de maneira central. Os relatos, mitos, cantos, foram ouvidos em condições específicas, mas sempre da boca dos intelectuais mbya. Todavia, como são os casos dos materiais que compõem o corpus de Ayvu Rapyta, foram somente registrados em papel, “transcritos”, ou melhor, transcriados em transcri(a)ções, em um outro contexto e um outro momento – isto é, em ocasiões e espaços distintos do momento da coleta. Geralmente, estavam ausentes tecnologias de gravação, como as em fitas magnéticas. L.Cadogan, no momento da coleta, fazia apenas pequenas anotações (tal como é possível inferir pelos parcos dados disponíveis a respeito) que, tais quais índices, em outros momentos desencadeariam os fios da memória. Como não existe memória possível que permita coletar uma tradição mitológica, de modo fidedigno, sem que se passa por demoradas e repetidas sessões de aprendizados, este horizonte indica, ainda mais, que L.Cadogan realizou processos de co-criações de modo radical e que dispunha de um conhecimento aguçado da língua mbya.Como afirmei, é impossível (ou me foi) reconstituir como eram os momentos em que se dava a coleta dos conhecimentos indígenas por L.Cadogan. Os protagonistas já não mais estão vivos, testemunhas destes momentos também não – o próprio filho de L.Cadogan, Rogélio, era muito criança e suas memórias são nebulosas e vagas a respeito. Os materiais disponíveis, no acervo de B.Melià, que registraram são bastantes escassos acrescentando pouco, ou quase nada, ao que o autor já apresenta em seus textos. Nestes, são ricas as referências aos interlocutores indígenas, situados nominal, geográfica e culturalmente, mas não há muitos informes, por exemplo, de como as narrativas, os cantos eram contados e cantados – em que estilo, quais vozes, as diferenças dialetais, elementos da prosopopeia –, de como e em que condições práticas conseguiu fazer registro deste manancial – ainda mais se tratando de um conhecimento com um léxico que é torcido, metafórico, idiossincrático e não plenamente compreensível a qualquer índio. Estão inacessíveis tanto as condições sociolinguísticas da gestação e construção contínua destes conhecimentos, quanto os recursos de que dispunha L.Cadogan para registrar estes conhecimento sem auxílio tecnológico de gravação. São também nebulosas algumas escolhas formais da escrita cadoganiana, por exemplo, o amplo uso de versificações para transpor os saberes mbya para o papel, alguns destes sendo típicas gestas míticas (portanto, não versos). [páginas 57 e 58]

vida e que, segunda as crenças mbya constitui parte integrante da natureza do homem, é: ery mo’ã a: aquilo que mantém erguido o fluir do seu dizer (Cap 4).Em resumo, os vocábulos ayvu, ñe’ëy e ‘e traduziriam os conceitos duplos de:1. linguagem humana, origem da porção divina da alma humana.2. palavra, porção divina da alma.3. dizer: o princípio vital; a alma, o dizer (Verbo) (Cadogan, 1997: 302-303).Comparando com os materiais empíricos de Nimuendaju e de Samaniego (Cadogan, 1997: 303), fica clara a ressonância do conceito de alma-palavra-divina entre os diferentes grupos guarani. Se há uma noção de fundo que alicerça o “mundo guarani” é aquela de alma, que se mantém apesar de todas diferenças linguísticas e sociológicas. Portanto, “temos [...] três nações falantes guarani, falando três dialetos distintos do guarani e povoando três regiões muito separadas entre si, que, para designar a parte divina, não perecível da alma humana, empregam vocábulos que traduzem o conceito de palavra, linguagem humana; quer dizer, para quem os conceitos de: porção divina da alma e linguagem humana constituem uma única ideia, um conceito indivisível”90 (ibidem: 303-304).Os Jeguakáva (Mbya do Guairá), os Avá Guarani da fronteira e os Apapokúva Guarani do Brasil: todos concebem uma dualidade da alma, porquanto estipulam que fala (linguagem humana) e porção divina da alma são sinonímias. Os grupos em questão também partilham raízes semânticas paralelas, utilizam cognatos de ang, ãngue (que, no guarani clássico, denotaria a ‘alma humana’) para designar a porção animal, telúrica, da alma 91.

90 Outros exemplos textuais, em empregos distintos: Ayvu no guarani clássico, esta termo denota a noção de ‘ruído’. ‘Ruído’ em mbya se diz evovo, hevovo. (1997: 43). Ñe’ë porã tenonde: as primeiras belas palavras. Nas tradições xamânicas, dizer ‘as primeiras belas palavras’ é mais frequente com a célebre expressão ayvu rapyta. Animais e plantas têm alma, têm ñe’ë y. Ãngue, palavra empregada para designar a alma do defunto (1997:43).

91 Outro exemplo do exercício de comparação de Cadogan, “salta aos olhos que este asygua, alma animal, segundo Nimuendaju, é o mesmo teko achykue (teko asykue), o produto das imperfeições humanas dos Jeguakáva. Ao morrer o Apapokúva, sua asygua – alma animal – se converte em anguéry, espírito perigoso; ao morrer o Mbya, sua teko achyku – produto de suas paixões – se converte em ãngue ou mbogua, espirito igualmente perigoso que se faz necessário afastar com rezas e fumo de tabaco, especialmente criado por Jakairá, deus da primavera, para este fim” (Cadogan, 1997: 305). [página 166]
[26210] 1° fonte: 31/12/2022
“Casa Grande & Senzala”, Gilberto Freyre



[5041] 2° fonte: 31/12/2022
Apareceu mais (um) doido no Palco da Reforma Agrária



[26043] 3° fonte: 31/12/2022
“O bandeirismo paulista e o recuo do meridiano”, Alfredo Ellis Jú...



[26241] 4° fonte: 31/12/2022
Diogo Arias de Aguirre, consultado em Real Academia de La Histori...



[8547] 5° fonte: 31/12/2022
A palavra “Sertanista” aparece pela primeira vez



[8548] 6° fonte: 31/12/2022
O termo “Bandeira” é usado pela primeira vez



[8545] 7° fonte: 31/12/2022
A palavra “paulista” é empregada pela primeira vez pelo Visconde ...



[8546] 8° fonte: 31/12/2022
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[23290] 9° fonte: 31/12/2022
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