“Com dois vinténs fundaram uma estrada de ferro”, Revista da Semana (30.04.1954)
30 de abril de 1954, sexta-feira. Há 70 anos
Quando se fala em Sorocaba surge logo, por uma associação de idéias, a figura do pe. Feijó, de permeio com a do duque de Caxias e de outros vultos famosos da revolução de 1842.A cidade rebelde chegou a ser sede do Governo revolucionário para todo o Estado, com ramificações em Minas Gerais. Sorocaba, ainda hoje, exibe em seu jardim público os canhões fundidos com o ferro de Ipanema, testemunhos seculares de agitações políticas dos fervorosos tempos dos começos do segundo reinado.Mas, falando em Sorocaba, também se deve relembrar outros motivos históricos mais empolgantes ainda. Um deles está ligado à espantosa história da fundação da estrada de ferro Sorocabana, legítima glória das tradições de energia dos paulistas.Logo que começou a empolgar o povo a idéia da estrada de ferro, com a inauguração das quatro primeiras, a Mauá, a de Pernambuco, a D. Pedro II e da Bahia, os homens de S. Paulo, já empolgados com a construção da Santos a lundiaí, inaugurada a 16 de fevereiro de 1867, os ituanos, em 1869 tiveram a idéia de ligar Itu a lundiaí por uma linha de ferro.Sorocaba, sua vizinha ao sul, já se ensaiando para tornar-se grande centro industrial, foi convidada para subscrever ações e ajudar na realização do empreendimento. Luís Matheus Maylasky, o famoso "estrangeiro misterioso" liderou os acionistas sorocabanos e conseguiu trezentos contos de réis de ações como contribuição de Sorocaba, com a condição, porém, de ser a estrada estendida até esta última cidade, ligando-a a Itu.A 20 de janeiro de 1870, na sala da Câmara Municipal de Itu, foi fundada a companhia ituana, honrada com a presença do presidente da província de S. Paulo, dr. Antônio Cândido da Rocha. Coube a Maylasky propor que a via férrea projetada continuasse até Sorocaba.A intervenção do delegado dos acionistas sorocabanos produziu inquietações nos presentes. Houve discussões, sendo a maioria dos ituanos contrária à ligação Itu-Sorocaba.Não havia recursos para isso, uma vez que o projeto inicial Jundiaí-Itu já se lhes antolhava difícil de realizar, quanto mais estender os trilhos até Sorocaba. E responderam: Não!Maylasky explicou, então, que os acionistas de Sorocaba retiravam sua colaboração aos ituanos e iriam construir também uma estrada de ferro de Sorocaba à capital da província. Sem mais interessar-se pelos problemas de Itu, deixou a sala da assembléia e se foi para Sorocaba acompanhado de todos os seus companheiros.O plano não foi abandonado pelos sorocabanos e, um dia, quando vários elementos da sociedade local se reuniam em palestra amistosa no adro da Matriz, após a missa dominical, veio à tona a construção da estrada.Havia otimistas e pessimistas. Mas, como todos eram homens de recursos, havendo mesmo alguns capitalistas, passaram a sugerir a subscrição de fundos, ali mesmo.Não havendo quem se atravesse a abrir a lista, Maylasky meteu os dedos no bolso do colete e, retirando dali uma moeda de 40 réis (dois vinténs) disse: "Aqui está o meu capital subscrito".